Dêiticos

Tempo de leitura: 4 minutos

Dêiticos são expressões linguísticas cujos sentidos dependem do contexto em que são enunciadas. Por exemplo, o sentido do advérbio aqui depende do lugar em que se realiza o enunciado. Para alguém que está no Rio de Janeiro e enuncia Aqui está chovendo, aqui designa Rio Janeiro. Se quem fala Aqui está chovendo se encontra em Recife, aqui significa Recife. Portanto, o sentido dessa palavra está atrelado à enunciação, ou seja, não apresentam um referente único e específico. O sentido é construído a cada nova enunciação.

Em um enunciado como: Hoje, eu estou aqui para te apresentar meu novo projeto – os pronomes eu e te expressam a categoria de pessoa: eu refere-se ao enunciador, designa aquele que fala, 1a pessoa; te refere-se ao enunciatário, designa aquele a quem se fala, 2a pessoa. O advérbio hoje expressa a categoria tempo e o advérbio aqui, a categoria lugar.

O sentido de eu, te, hoje e aqui só pode ser construído no contexto da enunciação: eu designa a pessoa que diz eu. Se quem profere o enunciado acima for Luana, eu designa Luana; se for Pedro, eu designa Pedro. O mesmo ocorre com o pronome te. Seu sentido é decorrente da enunciação. Se o enunciado acima é dirigido a Natália, te designa Natália; caso se dirija a Pedro, te designa Pedro.

Hoje não indica um dia específico, mas um tempo que coincide com o momento da enunciação (o agora). Aqui não designa um lugar específico, mas o lugar em que ocorre a enunciação. Se ela ocorre em uma sala de aula, aqui designa a sala de aula; se ocorre na sala do diretor, aqui designa a sala do diretor.

Em síntese, a construção do sentido de um enunciado como Hoje, eu estou aqui para te apresentar meu novo projeto depende de informações dadas pelo contexto, ou seja, quem fala, para quem fala, onde fala, quando fala, isso porque a interpretação de um dêitico só é possível pela enunciação. Como essa é a instância do euaquiagora, teremos três espécies de dêixis, cada uma delas correspondente a uma categoria da enunciação.

Dêixis pessoal: relativa à categoria de pessoa, ou seja, ao enunciador (eu) e ao enunciatário (tu/você). Os dêiticos que manifestam a dêixis pessoal são basicamente os pronomes pessoais (eu, tu, ele e suas formas oblíquas me, mim, te, ti, contigo, lhe, lhes etc.), os possessivos meu, teu, seu, nosso etc.

Dêixis espacial: relativa à categoria espaço. Tem por referência o lugar da enunciação (aqui). É manifestada por advérbios e expressões adverbiais de lugar: aqui, ali, cá, lá, acolá etc. e pronomes demonstrativos: este, esse, aquele etc.

Dêixis temporal: relativa à categoria tempo. Tem por referência o momento da enunciação (agora). Manifesta-se por meio de advérbios e expressões adverbiais de tempo (hoje, ontem, amanhã, agora, na semana passada etc.), pelos demonstrativos (este, esse, aquele etc.) e pelas formas dos tempos verbais: presente, passado, futuro. Além dessas três categorias de dêixis que apontamos, há também a dêixis textual. Nesse caso, os dêiticos não apontam para o lugar e o tempo da enunciação, mas a lugares e tempos do próprio texto. A dêixis textual é manifestada por expressões como: no capítulo anterior, no parágrafo seguinte, no comentário abaixo, no exemplo acima etc.

A dêixis textual permite a quem produz organizar o texto e facilitar o trabalho de quem lê, na medida em que orienta a leitura, como você pode observar no exemplo que segue em que destacamos as expressões que fazem a dêixis textual.

No capítulo anterior, vimos em que consiste nossa competência sintática e como poderíamos representá-la através de um modelo. Neste capítulo, começamos a fazer o mesmo em relação ao significado: veremos em que consiste exatamente a nossa competência semântica e como podemos representá-la. Isto significará, por um lado, identificar com maior clareza os dados relativos à semântica e, por outro, tentar dar conta deles desenvolvendo nosso programa de analisar aquilo que as expressões denotam.

Na tira a seguir, o efeito de sentido de humor ocorre da interpretação diferente que cada uma das personagens atribuí ao advérbio . Para um, , refere-se à cidade de Paris; para o outro, refere-se à parede.

Laerte.
Classificados. Livro 3. São Paulo: Devir, 2004, p. 58.

O assunto deste artigo é tratado com detalhes em nosso livro Práticas de leitura e escrita, publicado pela Editora Saraiva. Para adquiri-lo, clique aqui.

4 Comentários


  1. Maravilha, professor. Obrigada por compartilhar conosco todo o seu conhecimento. Tem me auxiliado muito em sala de aula . Obrigada!

    Responder

    1. De nada, Renata. Aproveito para lhe dizer aue amanhã (15/3) estarei de manhã na Somos fazendo uma gravação. Se der um tempo, apareça para a gente tomar um café.

      Responder

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.