Uso do acento grave

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No artigo, a partir de um post publicado pelo site UOL, teço algumas considerações sobre o emprego do acento grave ( ` ) em português. O propósito do artigo não é apresentar regras que determinam o uso desse sinal gráfico. Para isso, o leitor tem à disposição gramáticas da língua portuguesa.

O UOL reproduzia fala do Presidente do Chile, Sebastián Piñera, em reposta a uma declaração feita pelo Presidente Jair Balsonaro, tecendo críticas à ex-Presidente chilena e atual comissária da ONU para Direitos Humanos, Michelle Bachelet, e à memória do pai de Bachelet, morto pela ditadura de Augusto Pinochet. O texto reproduzido pelo UOL estava assim redigido.

“Não compartilho à menção feita pelo Bolsonaro por respeito à uma ex-presidente do Chile e, especialmente, em um tema tão doloroso como a morte de seu pai”.

Destaco, inicialmente, que o uso indevido do acento grave não deve ser imputado ao Presidente chileno, mas a quem reproduziu a fala dele por meio da língua escrita, no caso o UOL. Piñera falou (na verdade leu) a frase em espanhol ( o vídeo pode ser encontrado na internet). O UOL a traduziu para o português e a reproduziu por meio da língua escrita.

O acento grave é um sinal gráfico, portanto está no domínio da língua escrita. Em português um a com acento grave (à) deve ser lido da mesma maneira que um a sem o acento (a) . Exemplificando.

Nas frases Agradeço à ministra e Agradeço a ela, o a se pronuncia exatamente da mesma maneira. Em Agradeço à ministra, na língua escrita, usou-se o acento grave no a para indicar que ali houve a crase, isto é, a fusão de dois aa, a preposição a e o artigo a. Em Agradeço a ela, não se usou o acento grave no a, porque só há uma ocorrência do a, a preposição. Não há artigo nessa frase (o pronome ela não se faz preceder de artigo).

Em suma: em português usa-se o acento grave (`) para indicar, na língua escrita, a fusão de dois aa, fenômeno conhecido por crase.

No trecho que o UOL reproduz a fala de Piñera, o acento grave foi usado indevidamente duas vezes. Em “não compartilho à menção”, não há dois aa. O verbo compartilhar não pede a preposição a (quem compartilha compartilha algo). Há apenas um a ali, o artigo feminino a, que determina o substantivo menção. Em “por respeito à uma ex-presidente”, ocorre apenas a preposição a, exigida pelo substantivo respeito ( quem tem respeito tem respeito a alguém ou a algo). Como se pode observar, diante de ex-presidente não se empregou o artigo definido a, mas o indefinido uma (uma ex-presidente). Não havendo dos aa, não ocorreu a crase e, portanto, não se deveria empregar nesses dois casos o acento grave.

Por último, chamo a atenção para o fato de que erros no emprego do acento grave não são raros e, como disse, eles só ocorrem quando escrevemos. O problema é que um site que queira passar uma imagem de credibilidade não pode cometer desvios desse tipo. Lembro que uma das formas que usamos para distinguir uma Fake News de uma notícia verdadeira é o fato de as notícias falsas se apresentarem cheias de desvios da norma culta. Quando nós, leitores, nos deparamos com uma notícia com erros desse tipo logo acende a luzinha vermelha: isso deve ser Fake, jornal sério não comete esse tipo de erro.

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