Aporofobia

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Aporofobia é uma palavra que tem frequentado a imprensa e as redes sociais ultimamente. O que significa aporofobia? É o que se pretende responder neste post. Mas vamos devagar, começando pela etimologia da palavra.

Aporofobia é o que se denomina uma palavra composta, aquela que é formada por mais de um radical. Essa palavra resulta da junção de dois elementos de origem grega: aporo e fobia. O radical –fobia, que aparece como segundo elemento em palavras compostas, é bem familiar aos falantes do português, pois é bastante produtivo. Seu sentido é ‘aversão’ e aparece em um número bastante grande de palavras: fotofobia (aversão a luz); claustrofobia (aversão a lugares fechados); xenofobia (aversão a estrangeiro); homofobia (aversão a quem é homossexual), portanto, aporofobia é aversão a ‘aporo’ (pronuncia-se áporo, proparoxítona). Mas o que é áporo?

Trata-se de palavra de origem grega (aporos) cujo sentido primário é ‘sem passagem’. Avancemos um pouco. Em grego, áporo resulta da junção do prefixo a-, que exprime negação, o mesmo que aparece em ateu, amoral, ao radical –poros. Epa! Essa palavra já não é estranha a nós. Em grego, ela significa passagem. Em português, poro, mais usada no plural (poros), é o nome que se dá a cada um daqueles orifícios presentes na superfície da pele que funciona como duto condutor das glândulas sudoríparas e sebáceas. Em sentido amplo, poro é aquilo que permite a passagem. Chegamos ao sentido etimológico de áporo: sem passagem; sem saída. Para ilustrar o que é áporo, transcrevo um poema de Carlos Drummond de Andrade [1]ANDRADE, Carlos Drummond de. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Aguilar, 1973, p. 154.

ÁPORO

Um inseto cava
cava sem alarme
perfurando a terra
sem achar escape.
Que fazer, exausto,
em país bloqueado,
enlace de noite 
raiz e mistério?
Eis que o labirinto
(oh razão, mistério)
presto se desta:
em verde, sozinha,
antieuclidiana,
uma orquídea forma-se.

Originalmente, aporofobia é aversão àquilo que não permite passagem por falta de recursos. Daí a palavra passar a ser usada com o sentido de aversão a pessoa sem recursos, ou seja, pobre, foi um pulo.

Há algum tempo, passou-se a usar a palavra aporofobia para designar aversão, repulsa, hostilidade, desprezo a pessoas em situação de pobreza. O personagem Justo Veríssimo, criado pelo humorista Chico Anysio, ficou famoso com seu bordão: “Odeio pobre. Eu quero que pobre se exploda”, com que satirizava a aporofobia de parcela de políticos brasileiros.

A aporofobia é uma forma de discriminação fundada exclusivamente na condição social (a pobreza) não devendo ser confundida com o racismo, discriminação em relação a grupo étnico, ou com a xenofobia, discriminação em que se se leva em conta a origem da pessoa (estrangeiro).

O jornal Folha de S. Paulo, em sua edição de 24 de janeiro de 2022, apresenta a seguinte manchete “População de rua cresce 31% durante a pandemia” e chama a atenção para o fato de que o número de famílias que moram nas ruas de São Paulo quase dobrou durante a pandemia.

O crescimento da pobreza escancarou a aversão que muita gente tem em relação a pessoas sem recursos, em especial àquelas que passaram a viver nas ruas. Isso é bastante visível nas transformações operadas na arquitetura das cidades que as torna hostil a moradores de rua como se vê na foto abaixo.


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References

References
1 ANDRADE, Carlos Drummond de. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Aguilar, 1973, p. 154

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