Modalizadores

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Em post recente, tratei da impessoalização da linguagem, estratégia discursiva que consiste no apagamento das marcas que remetem à voz responsável pela autoria do texto, buscando com isso um efeito de objetividade. Seguidores do blogue me enviaram mensagens solicitando que tratasse também dos modalizadores. É o que faço a seguir.

A modalidade está relacionada a uma função interpessoal da linguagem que evidencia os vários graus de comprometimento do falante com os enunciados. Modalizadores, segundo a professora Angela Kleiman, em seu livro Texto e leitor: aspectos cognitivos da leitura (Pontes, 2008) são “aquelas expressões que indicam o grau de comprometimento do autor com a verdade, ou a justeza da informação, relativizando-a ou para mais, a certeza absoluta, ou para menos, a possibilidade mais remota”. Exemplificando: a candidatura de um político à reeleição pode não apenas ser afirmada (O governador é candidato a reeleição), ou negada (O governador não é candidato à reeleição), mas também comportar vários graus de comprometimento do falante com o que diz, seja esse comprometimento mais ou menos categórico, como podemos observar nas sentenças que seguem.

O governador pode ser candidato à reeleição.

O governador parece ser candidato à reeleição.

O governador provavelmente é candidato à reeleição.

O governador com certeza é candidato à reeleição.

O governador deverá ser candidato à reeleição.

Nos exemplos acima, as expressões destacadas funcionam como modalizadores, exercendo um papel muito importante na construção de sentido dos enunciados, na medida em que sinalizam para o interlocutor o modo como o que se diz é dito. Os modalizadores podem se apresentar sob diversas formas lexicais:

1. expressões dependentes de uma oração principal formada de verbo ser + adjetivo (é possível, é provável, é certo, é fato, é incontestável etc.), como podemos observar nas sentenças a seguir:

É possível que o governador seja candidato à reeleição.

É certo que o governador será candidato à reeleição.

Os itens lexicais é possível e é certo modalizam a informação contida em o governador é candidato à reeleição. Nesse caso, temos um tipo de modalidade que se opera no par certo / incerto.

2.  advérbios e locuções adverbiais de modo, de dúvida, ou de afirmação (talvez, possivelmente, indubitavelmente, obviamente, com certeza, sem sombra de dúvidas, provavelmente etc.) também são empregados com função modalizadora como se observa em

O governador provavelmente será candidato à reeleição.

O governador com certeza será candidato à reeleição.

Há casos em que a função modalizadora do advérbio não incide sobre a informação contida no predicado das sentenças, mas sobre todo o enunciado, revelando a atitude subjetiva do enunciador em relação àquilo que enuncia, como em

Sinceramente, não esperava de você uma atitude como esta.

Em outros casos, o advérbio é empregado para enquadrar o que se enuncia sob um determinado ramo do conhecimento como em

Juridicamente, ele não tem direito a receber as verbas reclamadas.

3.  verbos auxiliares também são usados com funções modalizadoras, particularmente, os verbos poder e dever, como podemos observar em

O governador poderá ser candidato à reeleição.

O governador deverá ser candidato à reeleição.

4.  certas palavras e expressões, que pelo próprio conteúdo semântico, prestam-se a modalizar enunciados. É o caso de verbos como supor, crer, achar, parecer, imaginar etc. como podemos observar nas sentenças a seguir.

Supõe-se que o governador será candidato à reeleição.

Creio que o governador seja candidato à reeleição.

5.   certas formas verbais como o futuro do pretérito do indicativo, como em

Tal atitude exigiria muita determinação dos envolvidos.

Uma decisão desse tipo acarretaria protestos de ambas as partes.

Quando o tema é modalização, há quem insista na nomenclatura técnica, classificando-a em tipos, a saber, modalidade epistêmica, relacionada às condições de verdade do enunciado, modalidade deôntica, relacionada à obrigatoriedade ou não obrigatoriedade de o conteúdo do enunciado ocorrer, e modalidade apreciativa, relacionada à avaliação do enunciador em relação ao enunciado.

O conhecimento sobre a modalização da linguagem, porém, não se restringe em saber uma nomenclatura específica, ou seja, se ela é deôntica, epistêmica, ou apreciativa. O importante é reconhecer os efeitos de sentido que produzem os modalizadores para que se possa construir o sentido dos textos que se leem e saber usá-los na elaboração de textos a fim de obter os efeitos de sentido pretendidos. A modalização diz respeito à linguagem verbal, portanto é manifestada linguisticamente, o que implica domínio de tópicos gramaticais, como os arrolados nos itens 1 a 5.

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