Diferença entre conto, novela e romance

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Uma assinante do blogue enviou-me mensagem perguntando qual a diferença entre a novela e o romance. Neste post, procuro responder essa pergunta de forma objetiva. Para isso, voltarei a falar de um gênero literário já tratado aqui no blogue: o conto.

Atualmente, os gêneros literários do discurso narrativo mais cultivados são o romance, o conto e a novela. Todos contam uma história em que há personagens, sequência de acontecimentos, tempo e espaço. Além disso, há quem narra os acontecimentos: o narrador, que pode ser ou não personagem da história narrada.

A diferença entre esses três gêneros literários reside principalmente em sua extensão. O conto é uma narrativa breve, condensada; não é por acaso que, em inglês, recebe o nome de short history. A extensão da narrativa evidentemente traz implicações de outra ordem.

Não há propriamente uma definição de conto. Mário de Andrade, para quem conto é aquilo que seu autor batizou de conto, já chamava a atenção para esse fato ao iniciar seu conto Vestida de negro com a seguinte afirmação: “Tanto andam agora preocupados em definir o conto que não sei bem se o que vou contar é conto ou não, sei que é verdade“. Apoiado em alguns autores e teorias sobre o conto, apresento a seguir as características desse gênero literário, por meio de analogias a outras formas narrativas, particularmente o romance.

O conto costuma apresentar um número pequeno de personagens, unidade de tempo restrito, normalmente centrado em um único evento, abdicando de análises minuciosas, digressões e descrições pormenorizadas. Por ser uma forma narrativa, o conto costuma ser analisado e definido em relação a outras formas de narrar, particularmente o romance. Se o romance é um gênero ligado à tradição escrita, o conto tem suas origens na tradição oral, no ato de contar histórias, que eram passadas de geração a geração.

Para Edgar Allan Poe, que, além de contista, é também um teórico do conto, a extensão é requisito fundamental do conto, já que esse gênero literário deve buscar uma unidade de efeito, enganar, aterrorizar, encantar ou deslumbrar, e essa só pode ser conseguida se o texto for possível de ler numa sentada, de meia a duas horas. Para Poe, o trabalho de um contista deve ser racional, tudo deve ser pensado a fim de se obter o resultado pretendido, que é criar o interesse do leitor, para isso “… inventará os incidentes, combinando-os da maneira que melhor o ajude a conseguir o efeito preconcebido…”.

O célebre contista Júlio Cortázar compara o romance a um filme enquanto o conto é comparado a uma fotografia. Para esse autor, o romance realiza um abordagem horizontal; o conto, uma vertical. Por ser uma narrativa condensada, o conto elimina tudo o que acessório, centrando-se naquilo que é essencial à trama, evitando intrigas acessórias. O escritor russo Tchekhov, referindo-se a esse gênero diz: “se num conto aparece uma espingarda, ela tem que disparar“. Cortázar tem uma frase que ilustra bem a diferença entre o conto e romance: “o romance ganha sempre por pontos, enquanto o conto deve ganhar por nocaute.”

O romance, dentre os gêneros narrativos, é, sem dúvida, o de maior aceitação nos dias de hoje, atingindo um público bastante variado, uma vez que há romances para todos os gostos, desde os sentimentais de leitura fácil, a formas altamente elaboradas e inovadoras, que exigem por parte do leitor um maior esforço cognitivo para sua compreensão. 

O que caracteriza o romance é o fato de contar uma história. A história narrada, também chamada diegese, é a espinha dorsal dos gêneros narrativos, mas diferentemente do conto e da novela, a história narrada no romance tem certa extensão e, eventualmente, pode apresentar ramificações, histórias paralelas, histórias que se encaixam em outra história.

O romance costuma apresentar personagens em maior número que o conto e a novela, além do que, sobretudo no que se refere às personagens principais, há uma maior caracterização delas tanto física quanto psicológica. São elementos constitutivos do romance: ação (evento narrado), personagem, espaço. Cumpre lembrar ainda que a ação se desenrola no tempo, seja ele cronológico ou psicológico. Além disso, há um narrador, aquele que conta a história, que pode ser ou não personagem da história narrada.

Em português, denomina-se novela o gênero literário narrativo de extensão intermediária entre o romance e o conto, apresentando os mesmos elementos desses gêneros: ação, personagem e espaço. Além disso, assim como o romance, a ação se desenvolve no tempo (geralmente cronológico) e há a presença de um narrador. Em inglês, novel, e em espanhol, novela designam o gênero literário que, em português, denomina-se romance. Comparada ao romance, a ação da novela apresenta um ritmo mais rápido, com menos descrições, análises psicológicas e intromissões do narrador. Por haver um predomínio de ações sobre reflexões, o tempo da novela é o cronológico, praticamente sem anacronias, recuos ou avanços na diegese. O espaço não tem um papel relevante, uma vez que a novela centra-se em ações de personagens. 

A novela, embora tenha se modernizado, é um gênero bastante antigo. As histórias do Decameron, de Boccaccio, textos do século XIV, podem ser consideradas novelas. Embora tenha grande extensão, o Dom Quixote, de Cervantes, também deve ser considerado novela, particularmente uma novela que critica as novelas de cavalaria, comuns na Idade Média. São exemplos de novelas modernas O alienista, de Machado de Assis, A morte e a morte de Quincas Berro D’Água, de Jorge Amado, e A metamorfose, de Franz Kafka.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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