Escrevendo com o computador

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Ficamos acostumados a escrever textos exclusivamente usando o teclado de um computador. Reservamos a caneta apenas para escrever anotações, recados, pequenas listas, bilhetinhos, avisos, dedicatórias em livros, enfim, coisas de pequeníssima extensão em que inexiste a preocupação em ordenar ideias. Usando o computador, desenvolvemos algumas técnicas que essa tecnologia proporciona e que, na escrita quirográfica, são impraticáveis. Uma delas é a possibilidade que temos de ir mudando o texto recortando trechos e colocando-os em outros lugares para ver se o resultado fica melhor.

O que se faz com partes de frase, pode ser feito com um parágrafo inteiro. Podemos mudá-lo de lugar. Desmembrar um parágrafo em dois, ou o contrário, transformar dois parágrafos num único. Com o computador, escrever ficou mais lúdico. Palavras e frases são como os peças de um quebra-cabeça que vamos mudando de lugar fazendo aquelas peças irem tomando a cara de um texto, ou seja, um todo de sentido provido de coerência. Exemplifico esse procedimento a partir de um trecho de texto publicado em jornal de circulação nacional.

Coluna de Mônica Bergamo no jornal Folha de S. Paulo, apresentava uma entrevista com o ator Gabriel Leone. Não eram falas do ator em primeira pessoa, mas reprodução, pela jornalista e/ou sua equipe, do que disse o ator na entrevista, ou seja, os enunciados eram em terceira pessoa. Em certo trecho, lê-se o seguinte:

“Vacinado contra a Covid, o ator diz que ficou a maior parte do tempo no Rio de Janeiro, onde nasceu, durante a pandemia.”

A posição do adjunto adverbial ‘durante e pandemia’ provoca algum ruído. É certo que o conhecimento de mundo do leitor permite saber que o ator global Gabriel Leone não nasceu durante a pandemia. Além disso, ao usar uma vírgula para separar o adjunto ‘durante a pandemia’ do verbo que o antecede, sinaliza ao leitor que esse termo não se refere ao verbo nascer. Compete ao leitor “descobrir” a que verbo o adjunto se refere. Nada complicado, mas quem escreve deve procurar facilitar a vida do leitor.

Com os processadores de texto esse tipo de problema é muito fácil de resolver, além de fazer menos sujeira. Pega-se o termo que pode estar causando o ruído e experimenta-se colocá-lo em outras posições na frase, até descobrir em qual lugar ele deixa o texto mais claro, sem possíveis ambiguidades. Age-se por tentativa e erro mesmo. Então, recortando e colando o adjunto ‘durante a pandemia’, podemos ter:

Vacinado contra a Covid, o ator diz que ficou a maior parte do tempo no Rio de Janeiro, durante a pandemia, onde nasceu. Fica ainda pior que original.

Vacinado contra a Covid, o ator diz que ficou a maior parte do tempo, durante a pandemia, no Rio de Janeiro, onde nasceu. Melhora.

Vacinado contra a Covid, o ator diz que ficou, durante a pandemia, a maior parte do tempo no Rio de Janeiro, onde nasceu. Também melhora.

Vacinado contra a Covid, o ator diz que, durante a pandemia, ficou a maior parte do tempo no Rio de Janeiro, onde nasceu. Melhora ainda mais. Eu ficaria com essa.

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