O léxico

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O conjunto de palavras de uma língua denomina-se léxico. Como se trata de um conjunto bastante extenso, os falantes não têm o domínio completo dele. O léxico é um inventário aberto, isto é, o tempo todo surgem palavras novas que se incorporam a ele e isso pode ser observado em diversas variedades da língua. O léxico tem caráter social; é patrimônio de um povo, não de uma pessoa ou de um grupo de pessoas.

Embora, na linguagem comum, sejam usadas como sinônimas, as palavras léxico e vocabulário designam coisas diferentes. O léxico refere-se à totalidade de palavras de uma dada língua, aí incluídas as novas e aquelas que não são mais usadas. O vocabulário, por sua vez, é o conjunto de palavras que ocorrem em determinado contexto de uso. Todo falante e grupos de falantes que se identificam por algumas características comuns (idade, região, profissão, atividade, etc.) têm um determinado vocabulário, que é sempre um recorte do léxico. Assim, devemos dizer o vocabulário dos jovens, o vocabulário dos advogados, o vocabulário de Guimarães Rosa, etc. e não o léxico dos jovens, o léxico dos advogados, o léxico de Guimarães Rosa. Em síntese, com base nos conceitos de língua e fala, como propostos por Saussure, o léxico pertence à língua (o sistema); o vocabulário é relativo à fala (o discurso).

Quanto ao vocabulário de uma pessoa. Ele pode ser ativo ou passivo. No primeiro caso, corresponde às palavras que o falante faz uso. No segundo, é representado pelas palavras que ele compreende, mas que normalmente não faz uso.  

O português é uma língua proveniente do latim vulgar, portanto seu léxico é predominantemente formado de palavras provenientes dessa língua, mas muitas palavras que fazem parte do léxico do português foram tomadas por empréstimo de línguas modernas como mouse, escâner, meme, pizza, tchau, chique, toalete. Outras foram formadas dentro da própria língua como fumódromo, tecnobrega, desindexar, panelaço. Em outras, tomou-se uma palavra estrangeira e se agregou a ela um afixo do português, como em tuitar e tuitaço (de Twitter + ar e Twitter + aço, respectivamente).

Em outros casos, a palavra nova é criada por alteração de sentido de outra já existente, como a palavra laranja, usada para designar quem acoberta transações financeiras ilícitas, ou a palavra sacolão para designar uma espécie de comércio popular de frutas, legumes e hortaliças.

Tomar por empréstimo palavras de outras línguas não é novidade. O contato com outras culturas sempre proporcionou que se incorporasse ao léxico palavras de outras línguas. Pertencem ao léxico português inúmeras palavras tomadas por empréstimo ao árabe, como álgebra, açúcar, caravana, fulano, laranja, incorporadas ao léxico português há séculos.

Nos dias atuais, é cada vez mais frequente o empréstimo de palavras do inglês. São usadas para indicar modernidade, alta tecnologia, inovação (site, download, hacker, startup, spoiler, delivery, fast-food, home office, brainstorm, banner, etc.). Os empréstimos do francês são bem menores do que em épocas passadas e hoje aparecem para indicar sofisticação, bom gosto. São mais comuns em textos que tratam de moda e culinária (boulangerie, croissant, couvert, nécessaire, lingerie, etc.).

Alguns empréstimos são grafados em sua forma original, como os acima citados. Outros são aportuguesados: bife (do inglês, beef), líder (do inglês, leader), panqueca (do inglês, pancake), futebol (do inglês, football); suflê (do francês, soufflé),  bufê (do francês, buffet), sutiã (do francês, soutien).

Línguas africanas trazidas para o Brasil com os escravos e o tupi contribuíram decisivamente na formação do léxico do português brasileiro. São exemplos de palavras oriundas de línguas africanas: samba, bunda, vatapá, orixá, dendê, bambambã. Do tupi, são exemplos: pipoca, peroba, jururu, pacu, juriti, copaíba, jabuticaba, carioca, jururu, etc. Muitos topônimos brasileiros (nomes de próprios de lugar e de acidentes geográficos) têm origem no tupi: Sergipe, Aracaju, Araçatuba, Catanduva, Piauí, Paraíba, Tamanduateí, Anhangabaú, Mooca, Tietê, etc.

As palavras podem ser decompostas em unidades significativas menores, os morfemas. Linguistas consideram que o léxico de uma língua compreende não apenas as palavras mas também os morfemas da língua, o radical e os afixos (prefixo e sufixo), por exemplo.

O conhecimento dos morfemas da língua é essencial para compreendermos os processos de formação palavras, na medida que palavras novas formadas dentro da língua portuguesa costumam resultar da junção de radicais, como a palavra tecnobrega, ou de afixos a um radical, como em panelaço.

Palavras novas formadas dentro da língua pelo acréscimo de afixos a radicais (derivação), ou mesmo pela junção de radicais, a rigor, não são novas. Como os morfemas que entram em sua formação já fazem parte do sistema da língua, essas palavras “novas” já existiam potencialmente na língua. Palavras como panelaço e bafômetro, por exemplo, já estavam latentes na língua. Em sua criação, apenas se juntaram morfemas já existentes: panel(a) + aço e bafo + metro. Justamente por isso os falantes não as estranham e identificam seus sentidos rapidamente, porque elas estão de acordo com o sistema da língua. 

2 Comentários


  1. Olá,
    Eu não sou nenhum entendido na língua portuguesa, apenas mais curioso que outra coisa, mas sempre tive, como distintos autores da nossa sociedade, alguma relutância em relação ao acordo ortográfico, especialmente no que à queda de consoantes diz respeito, no caso de se não pronunciarem, como em batismo, que antes se escrevia com um p, de harmonia com a origem latina, e agora já não… até a palavra parece estranha!
    Se a ideia era harmonizar, há pessoas que exageram, como em “contacto” que no Brasil não leva c, mas em Portugal também há pessoas a escreverem sem c, o que no fundo, acaba por ser errado, já que pronunciamos com c, como em “facto”!
    Mas há outra curiosidade, é que, segundo o Dicionário Priberam, que eu uso, “espetáculo” não leva c segundo o acordo, referindo exatamente essa circunstância!
    No entanto, em “espetador”, pode ter as duas grafias, segundo o mesmo acordo, como ao mesmo tempo, diz o dicionário!
    Vamos nós entender estas divergências, no mínimo aparentes!
    Cumprimentos
    António Quinteiro

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    1. António, o problema é que o Acordo Ortográfico não conseguiu resolver satisfatoriamente a unificação dos sistemas ortográficos do português e ainda deixou mais confuso do que já era.

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