Sintaxe e ambiguidade

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Quando produzimos textos, falados ou escritos, realizamos duas operações: seleção e combinação. Dentro de uma classe (substantivos, adjetivos, verbos etc.), selecionamos palavras, por ex, belo, bonito, lindo; menino, garoto, guri e as combinamos para formar unidades de sentido: menino bonito, belo garoto, lindo guri. A combinação se dá na cadeia no fala, isto é, horizontalmente, de modo que as palavras relacionam-se uma às outras. A parte da gramática que trata da combinação das palavras recebe o nome de sintaxe. Ocorre que, em alguns casos, quando combinamos palavras, pode ocorrer de a frase comportar mais de um sentido, ou seja, ela pode ficar ambígua. Nesse caso, temos o que se chama de ambiguidade sintática ou estrutural.

A frase Pedro me mandou um cartão postal de Veneza, pode ser lida de duas maneiras:

a) Pedro enviou, de Veneza, um cartão postal para mim.

b) Pedro me mandou um cartão postal no qual aparece algo de Veneza.

Na frase, Pedro me mandou um cartão postal de Veneza, a ambiguidade não decorre de duplo sentido das palavras. Cada palavra tem um sentido unívoco, mas do fato de “de Veneza” poder estar combinada com “cartão postal” ou “mandou”. O que significa que ambiguidade resulta de um fato sintático. Veja outro exemplo:

O menino viu o incêndio do prédio.

Cada palavra tem sentido unívoco: menino é menino; viu é forma do verbo ver; incêndio é incêndio e prédio é prédio. A ambiguidade não decorre de duplo sentido de uma palavra, mas por uma dupla possibilidade combinatória: “do prédio” pode estar se referindo a “viu” (viu do prédio), ou a incêndio (incêndio do prédio). Temos, portanto uma ambiguidade sintática.

Você pode estar perguntando: como se desambiguiza essa frase? Em outras palavras: o que fazer para que ela não fique com duplo sentido? Em primeiro lugar, afirmo que, na maioria dos casos, o contexto se encarrega disso. No fundo, a ambiguidade da frase decorre de ela estar fora de contexto. Num texto (uma notícia de jornal, por exemplo), os elementos que aparecem antes ou depois da frase permitiriam saber se o menino estava no prédio, ou se viu o prédio pegar fogo. Mas se você quiser ser rigoroso, teria de mudar a ordem dos termos para deixar claro se “do prédio” refere-se a “viu”, ou “incêndio”, ou substituir “incêndio” por uma outra expressão. Assim:

Do prédio, o menino viu o incêndio, O menino viu, do prédio, o incêndio, O menino viu o prédio sendo consumido pelas chamas.

Encerro este artigo comentando uma postagem que uma amiga colocou no Facebook, na qual dizia:

Assim que vi a postagem, mandei uma mensagem a ela: “Se você queria que ninguém visse, por que publicou no Facebook?” Foi uma forma irônica de chamar a atenção dela para o problema do texto. Evidentemente, eu sei que ela quis dizer que o Facebook removeu as páginas para que as pessoas não vissem as fotos que ela publicou. No entanto, da forma como estava redigido, alguém poderia entender que ela não queria que ninguém visse as fotos que estava publicando. Então por que publicar? Um caso típico de ambiguidade sintática, já que “para que ninguém visse” pode estar se referindo a “publiquei” ou a “removeu”.

Acrescento que nem seria necessário que ela escrevesse o “para que ninguém visse”, já que o texto ficaria claro sem essa expressão, além do que se tornaria mais conciso. Foi o que ela acabou fazendo.

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