Emprego do infinitivo

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No artigo, trato de um assunto espinhoso: o emprego do infinitivo.

Celso Cunha e Lindley Cintra, em sua Gramática do português contemporâneo, chamam a atenção para as dificuldades no emprego dessa forma nominal do verbo, afirmando que

O emprego das formas flexionadas e não flexionadas do infinitivo é uma das questões mais controvertidas da sintaxe portuguesa. Numerosas têm sido as regras propostas pelos gramáticos para orientar com precisão o uso seletivo das duas formas. Quase todas, porém, submetidas a um exame mais acurado, revelaram-se insuficientes ou irreais (CUNHA; CINTRA, 2007, p. 485).

O infinitivo

O infinitivo é chamado de forma nominal do verbo porque, em muitos contextos, assume um papel de substantivo, podendo, inclusive, vir acompanhado de um termo que lhe complete o sentido ou lhe acrescente uma circunstância qualquer.

Viver é muito perigoso.

A nutricionista me recomendou cortar os carboidratos.

Dirigir sem habilitação é infração gravíssima.

Em português, além do infinitivo impessoal, que não tem sujeito e, portanto, não se flexiona (amar, vender, partir, ser, estar, etc.), há ainda o infinitivo pessoal, que possui sujeito e que se flexiona em pessoa e número para concordar com o sujeito. O infinito pessoal, a forma conjugada, é um idiotismo do português, entendendo-se por idiotismo, algo particular de uma língua.

Emprego do infinitivo

Não é fácil sistematizar o emprego do infinitivo, pois há oscilações até mesmo entre os gramáticos. As dificuldades decorrem do fato de que, em português, além da forma não flexionada (impessoal), existir também a forma flexionada (pessoal). Acrescento ainda que o infinitivo pode ser presente ou pretérito, fato que grande parte das gramáticas não menciona.

  • Infinitivo impessoal presente: ser
  • Infinitivo impessoal pretérito: ter sido
  • Infinitivo pessoal presente: ser, seres, ser, sermos, serdes, serem
  • Infinitivo pessoal pretérito: ter sido, teres sido, ter sido, termos sido, terdes sido, terem sido.

Uso das formas flexionadas e não flexionadas

Em muitos casos, a opção pela forma flexionada ou não flexionada do infinitivo está relacionada a questões de estilo e/ou de ênfase; por exemplo, usar o infinitivo impessoal para destacar a ação em si, ou usar o infinitivo pessoal para dar ênfase ao sujeito da ação. Em suma: em vez de se falar em regras, o melhor é que se fale que há tendências, que, tentando, na medida do possível, ser simples e didático, apresento a seguir.

Emprega-se o infinitivo não flexionado (impessoal)

  • quando ele não estiver se referindo a sujeito nenhum.

É proibido fumar.

  • quando funciona como complemento de um adjetivo. Nesse caso, virá regido por preposição.

Estamos apto a trabalhar.

Obs.:  no caso de ser precedido pela preposição de, regida por adjetivos como fácil, difícil, possível ou semelhantes, o infinitivo assume sentido passivo:

São coisas fáceis de resolver. (isto é, de serem resolvidas)

São tarefas impossíveis de cumprir. (isto é, de serem cumpridas)

Nesse caso, não se deve usar o pronome apassivador se, uma vez que o infinitivo já tem sentido passivo.

  • quando funciona como verbo principal de uma locução verbal. Nesse caso, a flexão ocorre no verbo auxiliar. O infinitivo pode estar relacionado ao verbo principal sem ou com preposição.

Todos devem comparecer na hora e local determinados.

Cássia acabou de sair.

  • quando empregado com valor de imperativo.

Fazer uma fila, por favor.

  • nos casos em que o infinitivo for dependente dos verbos causativos (deixar, fazer, mandar) e sensitivos (ouvir, sentir, ver e sinônimos) e o sujeito for representado por um pronome pessoal oblíquo.

Nesse caso, trata-se de infinitivo não flexionado, mas não impessoal, porque muitos gramáticos consideram que o pronome pessoal é sujeito do infinitivo.

Mandei-o comparecer à secretaria.

Não os vi chegar.

Obs. 1: No caso de orações em que o verbo indica reciprocidade, o infinitivo deverá ser flexionado:

Vi-os afastarem-se uns dos outros.

Mandei-as abraçarem-se.

Obs. 2: Quando tais verbos tiverem por sujeito um substantivo anteposto ao infinitivo, é opcional flexionar-se ou não o infinitivo:

Deixai os pequeninos vir a mim.

Deixai os pequeninos virem a mim.

Se o sujeito representado por um substantivo vier posposto ao infinitivo, é mais frequente o uso da forma não flexionada:

Deixai vir a mim os pequeninos.

Ouviu soar os clarins.

Emprega-se o infinitivo flexionado (pessoal)

  • quando ele tiver sujeito próprio (expresso ou implícito), diferente do sujeito da oração principal.

A única solução era permanecermos na fila.

A regra é os idosos sentarem e os jovens ficarem de pé.

Obs.: caso o sujeito, mesmo que seja o mesmo da oração principal, venha expresso antes do infinitivo, o infinitivo deverá se flexionar para concordar com o sujeito.

Para nós assinarmos o contrato, exigimos a revogação da cláusula 12.

  • quando não se pode ou não se quer determinar o sujeito do infinitivo (sujeito indeterminado). Para isso, deixa-se o infinito na terceira pessoa do plural.

Em algum lugar, ouvi dizerem que ele seria demitido. 

Desafio

Para encerrar este post, deixo uma questão relativa a emprego de formas verbais que me foi enviada por um amigo. A resposta envolve conhecimento do emprego de infinitivo, mas não só. No próximo post, apresentarei a resolução.

Segue a questão:

Meu colega me diz que em seu trabalho em um documento alguém redigiu o seguinte período:

Considerando que, na hipótese de o protesto já tiver sido lavrado, a publicidade do ato só poderá ser obstada mediante ordem judicial de suspensão dos efeitos do protesto.”

Uma outra pessoa afirmou que a redação correta seria

“Considerando que, na hipótese de o protesto já ter sido lavrado, a publicidade do ato só poderá ser obstada mediante ordem judicial de suspensão dos efeitos do protesto”.

Uma terceira afirmou que nenhuma das formas estava correta e que a redação correta deveria ser

“Considerando que, na hipótese de o protesto já tenha sido lavrado, a publicidade do ato só poderá ser obstada mediante ordem judicial de suspensão dos efeitos do protesto”.

Meu colega me questiona: quem está com razão?

Esse assunto é tratado em nosso Curso prático de gramática, publicado pela Scipione.

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